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Esqueletos No Armário (2ª Parte)



Sem saber como ordenar ao meu corpo que se mexesse, permaneci durante horas sentada no mesmo local. O telefone tocou várias vezes, a campainha da porta também ressoou uma vez. Não fui capaz de me mover. Aquilo que ali estava, mostrava um homem que eu não conhecia, mostrava algo... perturbador.
Já começava a escurecer quando Gabriel voltou para casa. Entrou, vinha a sorrir, o mesmo sorriso de sempre, mas que agora me parecia tão sinistro, quanto forjado. Pareceu não reparar na minha postura, e disse-me apenas “boa noite”, seguindo para a casa de banho.
O banho prolongou-se pelo que me pareceu uma eternidade e quando saiu da casa de banho, fitou-me.
- Andaste em arrumações? - perguntou lançando um olhar aos papéis espalhados pelo chão. Não fui capaz de responder. - Fizeste alguma coisa para comermos? Estou cheio de fome...
Consegui finalmente, obrigar os meus olhos a moverem-se de forma a encontrarem os seus. Um olhar vazio, sem... vida.
- Mariana... Está tudo bem?
Sem pensar, estiquei-lhe o caderno que ainda conservava na minha mão. O seu rosto endureceu ligeiramente, mas nem se aproximou da reação de pavor ou de fúria que seria adequada nesta situação. Limitou-se a pegá-lo e poisá-lo sobre a cómoda.
- Leste-o?
- Li.
A minha voz estava rouca e baixa, devido às várias horas de silêncio e imobilidade.
- Lamento. - referiu apenas. - Preferia que não descobrisses assim...
- Preferias que descobrisse como?
- Não sei.
Durante alguns minutos ficámos imóveis, a olhar um para o outro. Não conseguia pensar em nada adequado para dizer e ele parecia ter os mesmos problemas que eu.
- Eu não devia ter mexido. - referi, ao fim de um bocado.
- Pois não.
- Mas o que tens aí... tu..
- Eu sei.
Comecei a chorar.
- Que espécie de monstro és tu?
- Não sei.
O seu rosto mantinha-se sério, inexpressivo. Não parecia incomodado, não parecia envergonhado. Não parecia... nada.
- Eu posso explicar. Se me deixares.
Queria dizer que não, queria bater-lhe e gritar. Queria... não sentir a repentina e quase mórbida curiosidade que me avassalou. Não havia explicação possível.
- Deixo.

CONTINUA...      


(Imagem: poesiacarinho.blogspot.com)

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